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A abertura econômica da China promoveu um conjunto de transformações que reestruturou os moldes da sua sociedade. Longe do ideal planificador de Mao Tsé-Tung, a China hoje conta com uma imensa classe média. Variando em uma população que gira em torno dos 100 aos 150 milhões de indivíduos, essa classe intermediária partilha de conquistas comuns como carro, casa, férias e eletro-eletrônicos. Em certos termos, ela marca a ruptura de um Estado ainda conhecido por seu caráter intervencionista.
A criação de uma classe socioeconômica de tamanha proporção criou um grande choque de gerações e enfraqueceu a cultura subserviente da sociedade chinesa. Os integrantes desta classe conseguem notar as contradições do seu regime político. Saúdam os ganhos materiais e, ao mesmo tempo, tecem críticas tenazes contra as permanências autoritárias do Estado. Vivendo de forma muito recente, essas mudanças não mobilizam grandes movimentos de oposição ao governo.
A geração adulta que viveu o tempo dessas transformações ainda não consegue se integrar fielmente ao movimento das mudanças. Nos meios de comunicação, diversas situações relatadas não fazem jus a um país onde anteriormente o destino dos grupos sociais era perfeitamente descrito mediante a rigidez dos papéis sociais desempenhados por cada indivíduo. Fala-se sobre a americanização do nome dos recém-nascidos, do consumo de livros com temáticas outrora proibidas e do transtorno alimentar entre jovens vaidosas.
Outro interessante desdobramento pode ser visto na relação entre pais e filhos. A geração de pais da atual China carrega contradições notórias. Ao mesmo tempo em que se impressionam com os valores partilhados pelos seus filhos, não vislumbram outro tipo de vida para fora das exigências de um sistema de ensino que prega o aperfeiçoamento constante e a competição entre os mais bem preparados. A China lança as bases para um contexto social desconexo com a sua falta de liberdade de opinião e participação política.
Seria difícil dizer se as futuras gerações desse país se engajariam em um movimento de transformação política. O individualismo, a competitividade e o conforto material não permitem vislumbrar a deflagração de uma onda de protestos ou situações de conflito em prol da ampliação das liberdades civis e a liberação do sistema político. Ao mesmo tempo, os valores que garantem traços tão autoritários à China aparentam-se ameaçados por uma nova geração acostumada com laços familiares e um capital cultural distante dos moldes conservadores.
Por Rainer Sousa
Graduado em História