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A noção de progresso pode ter duas acepções: a primeira diz respeito a seu aspecto quantitativo que exibe a evolução da técnica na busca da dominação da natureza. O segundo aspecto é qualitativo e aborda o desenvolvimento das potencialidades humanas, visando a sua plena realização.
A visão psicanalítica de Freud coloca a impossibilidade da felicidade do ser humano. Isso porque de acordo com esta teoria, o trabalho na sociedade burguesa não é prazeroso, visto que é empregado como valor socialmente útil, o que causa a repressão das pulsões de Eros ou do princípio de prazer, impedindo a sua plena satisfação.
A evolução do progresso quantitativo ou técnico que utiliza ou dispende uma grande quantidade de energia pulsional se deu em detrimento do progresso qualitativo ou humano. A tentativa de dominação da natureza pelos homens acarretou a dominação destes pela produtividade. Esta condiciona o comportamento dos indivíduos em sociedade, visando sempre atender apenas às suas necessidades. Mesmo quando o indivíduo se beneficia com alguma melhora nas suas condições de existência é sempre para que a produção tenha maior eficácia e rentabilidade. A vida do indivíduo torna-se administrada, a visão linear do tempo determina o presente visando um futuro incerto, porém que se impõe a esse. O passado já não mais serve para nada.
Se para Freud esta visão só possibilita a infelicidade, para Marcuse ela é o ponto chave para o desenvolvimento humano. As condições técnicas que surgiram para satisfazer as necessidades básicas do ser humano já permitem que se dê um salto qualitativo para o progresso deste mesmo ser humano. Para isso, entretanto, é necessário dessublimar a cultura que só tende a produzir bens supérfluos e divulgar a aquisição de tais bens como fonte de liberdade e felicidade. Deve-se contrapor àquela visão linear de tempo, uma visão que tem apenas uma curva ascendente, uma visão do tempo pleno, de duração e satisfação reais. Para Freud, a infelicidade se caracteriza pela impossibilidade da realização dos desejos. Marcuse propõe a transcendência desses desejos a fim de alcançar a plena fruição das pulsões (claro, com o mínimo de repressão!) que caracterizam a verdadeira felicidade.
Portanto, a máscara do sistema caiu com a teoria de Marcuse que evidencia a indevida associação de liberdade e felicidade ao consumo de bens, o que na verdade provoca o efeito ilusório de satisfação, fomentando cada vez mais os desejos e tornando as pessoas doentes, pois a coisificação da expressão não é suficiente para a plenitude e satisfação. É necessária a desvinculação destas ideias CONSUMO = LIBERDADE, para que possamos pensar em um progresso realmente qualitativo de vida e de relações humanas. Como diz Marcuse, “o tempo compreendido de forma linear é vivido em relação a um futuro mais ou menos incerto” de forma que “o tempo pleno, a duração da satisfação, a duração da felicidade individual, o tempo como tranquilidade, só pode ser imaginado como sobre-humano...”. Esta pode ser uma alternativa para as reflexões atuais sobre sistemas produtivos, superando a antítese entre capitalismo e comunismo exagerados.
Por João Francisco P. Cabral
Colaborador Brasil Escola
Graduado em Filosofia pela Universidade Federal de Uberlândia - UFU
Mestrando em Filosofia pela Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP