A rainha Vitória é considerada uma das principais monarcas de toda a história inglesa, reinando por mais de 60 anos e sendo uma das figuras mais conhecidas mundialmente no século XIX. Seu reinado deu nome a um período histórico, a Era Vitoriana, marcada pelo imperialismo inglês, pela Bela Época, e pelo grande desenvolvimento tecnológico, econômico e científico para a Inglaterra.
Gerada para ser uma rainha, Vitória perdeu o pai ainda bebê e recebeu uma educação extremamente rígida, sendo controlada pela mãe. Tornou-se rainha muito jovem, casou-se com um príncipe alemão e se afastou temporariamente da vida pública após o falecimento dele.
Quando assumiu o trono, a monarquia era uma instituição questionada na Inglaterra. Quando deixou o trono, a monarquia constitucional estava consolidada no Reino Unido após um longo processo iniciado no século XIII.
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No século XVII, a Inglaterra passou por dois importantes eventos: a Guerra Civil Inglesa e a Revolução Gloriosa. A primeira terminou com a prisão, o julgamento e a execução do rei Carlos I. O estopim da guerra civil ocorreu quando o rei invadiu a Câmara dos Comuns com tropas para prender alguns parlamentares, uma afronta ao poder do Parlamento.
A Revolução Gloriosa, ocorrida em 1688, foi um movimento que alçou ao poder Guilherme, o príncipe de Orange, que assumiu o trono e assinou a Declaração de Direitos. Na prática a Revolução Gloriosa transformou o Reino Unido em uma monarquia constitucional, em que o Parlamento, controlado pela burguesia, passou a ter bastante poder.
Esse processo de perda do poder real continuou, com avanços e recuos em direção à soberania do Parlamento. Quando a rainha Vitória assumiu o trono, parte da população defendia o fim da monarquia e o estabelecimento de uma república.
O Reino Unido era um império em expansão quando ela foi coroada. A hegemonia inglesa no mundo havia se iniciado em 1588, quando a marinha inglesa da rainha Elizabeth I derrotou a “invencível armada”, modo pelo qual a marinha espanhola era chamada.
A partir desse momento, a Inglaterra passou a ter a marinha mais poderosa do mundo, conquistando diversas regiões em todos os continentes. O poder marítimo inglês continuou a aumentar nos próximos séculos, assim como os territórios conquistados. No século XVIII, iniciou-se na Inglaterra a Revolução Industrial, que transformou o país na maior potência econômica mundial.
No período do reinado da rainha Vitória, a Inglaterra passou pela segunda fase da Revolução Industrial, quando diversos inventos modificaram o mundo, como o motor a combustão interna, o gerador elétrico, o motor elétrico, o telégrafo, o telefone, entre diversos outros.
A rápida industrialização levou à necessidade de fontes de matéria-prima, de fontes de energia e de mercado consumidor. Essas necessidades levaram ao imperialismo inglês. Com o desenvolvimento industrial, houve grande êxodo rural na Inglaterra, o que provocou um processo de urbanização desorganizado, e milhões de pessoas passaram a viver em cortiços e outros locais com alta densidade demográfica.
A superpopulação e a falta de tratamento de água e de esgoto provocaram diversas epidemias em Londres e em outras cidades inglesas no período vitoriano. Foi nesse contexto de Império Britânico, de Revolução Industrial, de urbanização e de grandes problemas sociais e ambientais que Vitória se tornou rainha.
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Vitória nasceu de uma verdadeira corrida para geração de um herdeiro ao trono depois que a única neta do príncipe regente, Carlota de Gales, faleceu poucos dias após um parto em que a criança, que seria a herdeira do trono um dia, não sobreviveu. O rei George III tinha 12 filhos, mas nenhum deles tinha filhos legítimos que poderiam herdar o trono, isso fez com que príncipes e princesas iniciassem a corrida para gerar um herdeiro.
Nasceu como Alexandrina Vitória, em 24 de maio de 1819, no Palácio de Kensington. Ela era filha do príncipe Eduardo, duque de Kent, o quarto filho do rei George III, e de Vitória de Saxe-Coburgo Saalfeld, uma princesa alemã, viúva e mãe de dois filhos. O casamento entre os dois foi realizado às pressas após a morte de Carlota de Gales. Ela recebeu o nome Alexandrina em homenagem ao czar Alexandre I, da Rússia, e o nome Vitória em homenagem a sua mãe.
Em 23 de janeiro de 1820, o pai de Vitória faleceu de pneumonia. Seis dias depois, seu avô, o rei George III, também faleceu, e a futura rainha tinha menos de um ano. Vitória foi criada por sua mãe, que controlava completamente o cotidiano da filha, escolhendo seus professores, serviçais e até mesmo as crianças com as quais ela podia interagir.
Em 10 de fevereiro de 1840, Vitória se casou com seu primo de primeiro grau, Alberto de Saxe-Coburgo-Gota, príncipe alemão. Vitória registrou quase tudo o que fez e pensou durante a vida adulta em diários, em um deles ela registrou a boa impressão que teve ao conhecer Alberto, anos antes do seu casamento.
O casamento ocorreu na Capela Real do Palácio de São Tiago e a cerimônia foi conduzida pelo arcebispo de Canterbury. Para realizar a pintura oficial da cerimônia, foi escolhido o pintor George Hayter, o mesmo que havia pintado a cerimônia de coroação de Vitória.
Alberto teve grande influência sobre Vitória e, com o passar do tempo, passou a realizar reuniões com o primeiro-ministro e a receber comunicados confidenciais, funções do monarca. A rainha, aos poucos, se afastou das atribuições reais, e muitos contemporâneos afirmaram que quem governava o Reino Unido, de fato, era Alberto. Alguns historiadores chamam esse período da Era Vitoriana de albertino.
Pelos diários da rainha, podemos inferir que ela era apaixonada por Alberto e que era correspondida. A família real passou a ser um modelo de comportamento moral para o povo britânico e para todo o império.
A rainha Vitória teve nove filhos com Alberto, muitos deles geraram monarcas que governaram diversos países da Europa, por isso a ela tem o apelido de “avó da Europa”. Apesar do número elevado de filhos, a rainha sofreu em quase todos os períodos gestacionais e com depressão pós-parto. Em seus diários, ela se queixou da maternidade, mas a via como uma função real.
São atualmente monarcas descendentes da rainha Vitória:
Em dezembro de 1861, o príncipe Alberto foi diagnosticado com febre tifoide e faleceu em 14 de dezembro de 1861, no Palácio de Windsor.
A rainha se abalou profundamente com a morte do marido, entrando em luto e passando a usar roupas pretas até o fim dos seus dias, em 1901. Por anos após a morte de Alberto, ela viveu reclusa em seu palácio, fazendo poucas aparições públicas, como a abertura da sessão do Parlamento em 1866.
No período de isolamento, ela passou a ser chamada de “viúva de Windsor” e só retomou totalmente as obrigações monárquicas na década de 1870, quando viu a monarquia ameaçada.
Em 1883, já sexagenária, a rainha caiu da escada no Palácio de Windsor e sofreu diversos ferimentos, jamais se recuperando do acidente. Ela sofria com reumatismo e, na década de 1890, passou a ter seus movimentos limitados. Faleceu em 22 de janeiro de 1901, aos 81 anos, de aneurisma cerebral.
Antes de falecer, a rainha redigiu diversas instruções para o seu funeral, que teve o branco como cor predominante, mesma cor do traje com o qual ela foi sepultada em Windsor, ao lado de Alberto. Seu caixão foi carregado por diversas pessoas, entre elas o novo rei inglês, Eduardo VII, e o kaiser alemão, Guilherme II, neto de Vitória.
Vitória se tornou rainha com apenas 18 anos de idade, e, nos primeiros anos, ela foi fortemente influenciada pelo lorde Melbourne, primeiro-ministro do Reino Unido. A partir de 1840, quando se casou, foi a vez de o príncipe Alberto ter forte influência sobre ela.
Após a morte do marido, a rainha passou por um momento de distanciamento da vida pública e, a partir da década de 1870, ela retornou com grande autonomia, tornando-se uma das figuras mais conhecidas no mundo no século XIX.
A primeira crise enfrentada pela rainha se iniciou em 1845, quando uma grande fome atingiu a Irlanda. Um micro-organismo chamado Phytophtora infestants contaminou boa parte da produção europeia de batata na década de 1840. A praga causou grande fome na Irlanda, onde parte da população dependia exclusivamente do cultivo da batata. A crise agrícola e a fome atingiram o país por sete anos.
Aproximadamente um milhão de irlandeses perderam a vida pela fome ou em consequência dela,|1| outros tantos milhões migraram para outros países, sobretudo Estados Unidos e Canadá. A rainha foi acusada pelos irlandeses de não se preocupar com a situação, por isso, recebeu deles o apelido de “rainha da fome”.
O fato foi diversas vezes utilizado em propagandas de movimentos separatistas irlandeses. A rainha fez doações para tentar amenizar a crise, inclusive do próprio patrimônio, mas sua popularidade continuou em baixa na região por todo reinado.
Em 1870, uma nova crise se abateu sobre a monarquia inglesa. Na França, a Terceira República foi proclamada, e o movimento republicano ganhou força na Inglaterra. Grandes comícios foram realizados no período e contaram inclusive com alguns membros do Parlamento.
Vale lembrar que a rainha vivia seu luto pelo marido. Após o fortalecimento do movimento republicano, ela voltou à ativa, fazendo diversas aparições públicas, obras de caridade e participando das sessões de abertura do Parlamento.
Em 1887, ocorreu a celebração do jubileu de ouro da rainha Vitória, marcando seu meio século de reinado. As comemorações contaram com grande participação popular, assim como o jubileu de diamantes, ocorrido em 1897, nos 60 anos de reinado.
Todos os primeiros-ministros de todas as colônias britânicas participaram das festividades. A rainha voltou a ser popular no Reino Unido e sua imagem passou a estar presente em repartições públicas, lares e diversos outros lugares.
A rainha Vitória governou o Reino Unido por mais de 63 anos, tornando-se a monarca a governar por mais tempo na sua época, só perdendo esse título em 2015, para sua trineta Elizabeth II.
A rainha Vitória foi a soberana que criou a monarquia moderna inglesa. Para muitos historiadores, seu reinado foi responsável pela sobrevivência da monarquia. A partir da década de 1880, ela passou a ser uma monarca com grande popularidade no Reino Unido, sendo construída a imagem de que ela era uma espécie de mãe do povo britânico.
Durante o período vitoriano, diversas reformas política foram realizadas, e elas ampliaram o número de eleitores e reduziram o poder do monarca. Durante seu reinado, o lento processo que transformou a Inglaterra de uma monarquia absolutista para uma monarquia constitucional, iniciado séculos antes, foi concluído.
Durante sua vida, a rainha escreveu mais de 100 diários, e, após sua morte, sua filha Beatriz passou a cuidar deles e a publicá-los. Beatriz transcreveu os textos e destruiu a maior parte dos diários originais, muitos acreditam que ela excluiu das suas publicações parte dos diários que, na sua visão, prejudicaria a memória da mãe.
A rainha Vitória é considerada uma das principais monarcas do Reino Unido nos seus mil anos de existência. O período do seu reinado é considerado a era de ouro do Império Britânico, marcada por grande desenvolvimento econômico, político, tecnológico, científico e em diversos outros campos. Além disso, ela é considerada a monarca que preservou a monarquia quando esta era questionada por parte do povo britânico.
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Foi a rainha Vitória a primeira a tornar o monarca inglês uma espécie de figura pop no mundo. No início do seu reinado, ela se aproveitou da nova tecnologia do período, a fotografia, para popularizar seu rosto. Todos os anos, milhares de fotografias da rainha eram vendidas na Inglaterra e nas suas colônias. Vale lembrar que nessa época cerca de 1/5 do planeta fazia parte do Império Britânico.
Quando faleceu, em 1901, ela era uma das pessoas mais conhecidas no mundo. Após sua morte, ela continuou a ser popular e sua imagem foi utilizada largamente por seu filho, Eduardo VII, e por seus sucessores.
Em 1912, a rainha foi representada pela primeira vez no cinema, no filme mudo chamado The Victoria cross, da Paramount. Em 1937, foi lançado um filme sobre ela chamado Vitória, a Grande, mas sua apresentação no Reino Unido foi proibida pelo primeiro-ministro lord Chamberlain, alegando que a família real não poderia ser representada no cinema. O filme foi lançado nos Estados Unidos e teve grande bilheteria, sendo gravada uma sequência chamada Sessenta anos gloriosos.
Nota
|1|UK Parliament. Disponível em: https://www.parliament.uk/about/living-heritage/evolutionofparliament/legislativescrutiny/parliamentandireland/overview/the-great-famine/
Fontes
BAIRD, Julia. Vitória, a rainha: história íntima da mulher que comandou um império. Editora Objetiva, São Paulo, 2018.
GOODWIN, Daisy. Vitória: a jovem rainha. Harper Collins, Rio de Janeiro, 2017.
Fonte: Brasil Escola - https://brasilescola.uol.com.br/historia/vitoria.htm