A Lei Seca nos Estados Unidos vigorou entre 1920 e 1933. Durante esse período, a produção, transporte, venda, importação e exportação de bebidas alcoólicas era proibida nos Estados Unidos.
Desde o início do século XIX diversos movimentos defendiam a proibição da comercialização e consumo de bebidas alcoólicas. Esses movimentos eram ligados principalmente a igrejas do sul dos Estados Unidos.
Durante a Lei Seca, grupos de traficantes de bebidas surgiram. Com o tempo esses grupos entraram em conflito pelo monopólio do comércio de bebidas, provocando grande violência nas grandes cidades norte-americanas. Em 1933, durante a Grande Depressão, a Lei Seca foi revogada.
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O ser humano consome bebidas alcoólicas há milhares de anos. No Antigo Egito e na Mesopotâmia o consumo de cerveja e de vinho já eram populares em todas as camadas sociais. Os egípcios tinham inclusive uma grande festa relacionada à bebedeira, em homenagem à deusa Hathor, o Festival da Embriaguez. No dia do festival os egípcios se embriagavam durante todo o dia, festejando a vida.
Na América, antes mesmo da chegada dos europeus, diversos povos indígenas produziam e consumiam bebidas alcoólicas feitas à base de mandioca, milho, agave, entre outras plantas.
No início do século XIX surgiram nos Estados Unidos os primeiros movimentos que defendiam a proibição de consumo de bebidas alcoólicas, por considerarem-nas prejudiciais aos indivíduos e à sociedade. A maior parte desses movimentos foi organizada por igrejas protestantes, principalmente dos estados do sul.
A Sociedade Americana de Temperança, a ATS, foi fundada em 1826 e passou a defender a proibição do consumo de bebidas alcoólicas. Em dez anos a entidade já possuía mais de 1 milhão de membros. Em 1874, foi fundada a União Feminina de Temperança Cristã, que defendia a proibição do consumo de álcool para a redução da violência praticada pelos maridos.
Em 1881 o Kansas foi o primeiro estado norte-americano a proibir a produção, comercialização e consumo de bebidas alcoólicas nos Estados Unidos. Mas a lei não foi respeitada, e diversos estabelecimentos continuaram a vender bebidas alcoólicas, com as autoridades não fiscalizando e não punindo os infratores.
Nesse momento passou a ganhar fama Caroline Carrier Nation, ativista do movimento de temperança que passou a invadir bares e a destruir garrafas e barris de bebidas com uma machadinha. Ela ficou conhecida como Vovó da Machadinha e passou a ser temida por donos de estabelecimentos que vendiam bebida alcoólica. Nation acreditava que cumpria uma missão divina ao fazer isso.
Após o Kansas outros estados passaram a aprovar leis semelhantes, e a discussão da proibição chegou até o Congresso norte-americano. Durante a Primeira Guerra Mundial, o movimento pela proibição ganhou força. O movimento argumentava que a proibição garantiria grãos, cevada e trigo, principalmente, para o esforço de guerra.
Em 1918 uma lei que proibia a produção temporária de bebidas foi aprovada para garantir os grãos para o esforço de guerra. A principal bebida consumida no período era a cerveja, e a maior parte das cervejarias tinha nome e proprietários alemães, por isso beber passou a ser considerado um ato antipatriótico.
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Uma emenda à Constituição e uma lei federal foram responsáveis pela proibição da comercialização de bebidas alcoólicas nos Estados Unidos. A 18ª Emenda à constituição foi ratificada pelos estados norte-americanos em janeiro de 1919 e entrou em vigor um ano depois. A 18ª Emenda previa a “proibição de produção, transporte, importação ou exportação e venda de bebidas intoxicantes”, entre elas o vinho, cerveja e todos os tipos de destilados.
Em 28 de outubro de 1919 o Congresso norte-americano aprovou a Lei Volstead, a qual era um complemento da 18ª Emenda. A lei proibiu a produção, venda e transporte de bebidas que tivessem teor alcoólico maior do que 0,5%. A lei ainda previa penas para quem a descumprisse, que variavam de multas a pena de prisão. A lei passou a entrar em vigor em janeiro de 1920, juntamente com a 18ª Emenda.
Os movimentos de temperança defendiam que as bebidas alcoólicas levavam ao vício, fazendo com que a pessoa deixasse de ser produtiva e passando a viver somente em função da bebida.
O consumo de álcool era acusado de ser o grande responsável pelos altos índices de criminalidade no período, pela violência doméstica, pelos acidentes de trabalho e de automóveis, pelo grande número de pessoas em situação de rua, entre diversos outros problemas sociais.
A 18ª Emenda e a Lei Volstead entraram em vigor em 17 de janeiro de 1920. Nesse dia, mais de 1500 agentes federais ficaram responsáveis por fiscalizar estabelecimentos de diversas cidades do país. Agentes estaduais e distritais também foram convocados para a fiscalização.
Como as leis proibitivas foram aprovadas em 1919 e só entraram em vigor um ano depois, houve uma grande corrida em 1919 pela compra de bebidas alcoólicas. Famílias de posses compraram estoques inteiros, com o objetivo de armazenar bebidas para durar anos. Muitos afirmam que o próprio presidente Woodrow Wilson, que era contrário à Lei Seca, estocou bebidas para o futuro.
A aplicação da lei exigiu grandes gastos para os governos federal, estaduais e municipais. Somente nos seis primeiros meses da lei, mais de 7.500 pessoas foram autuadas por descumprimento. Em 1921, foram mais de 30 mil.
Muitas pessoas começaram a beber álcool puro durante a Lei Seca, o que levou o governo a obrigar que as empresas adicionassem produtos químicos que deixavam o seu gosto ruim e até mesmo envenenado. A historiadora Debora Blum afirma que mais de 10 mil pessoas morreram envenenadas por tomar álcool modificado durante a Lei Seca.
O primeiro grande problema provocado pela Lei Seca foi de caráter econômico. Com a entrada em vigor da Lei Seca, diversas fábricas de cerveja, de vinho e de outras bebidas alcoólicas foram instantaneamente fechadas, causando grande desemprego.
Também foram fechados todos os bares e tabernas e diversos serviços relacionados às bebidas alcoólicas, como motoristas de caminhões, carregadores, fabricantes de barris, de garrafas, entre diversos outros.
Ao contrário do que se pensava antes da aprovação da lei, o turismo caiu após a aprovação da lei, assim como o lucro de restaurantes, parques, cinemas e outras atividades relacionadas ao entretenimento. O governo federal e os estaduais também tiveram grande redução nas arrecadações de impostos, uma vez que as bebidas alcoólicas tinham altos impostos.
Outra consequência da Lei Seca foi o tráfico. Com a proibição, diferentes grupos passaram a traficar bebidas do Canadá, do México e do Caribe, regiões onde elas continuavam na legalidade. Com o tempo esses grupos se fortaleceram e começaram a lutar pelo controle do tráfico em diversas regiões do país, gerando extrema violência.
Al Capone é o criminoso mais famoso do período, ele e seu bando traficavam bebida, principalmente do Canadá para Chicago, e de lá para todos os Estados Unidos. Traficantes como Al Capone promoviam a corrupção policial, dos membros do Judiciário e de parte da imprensa, praticando livremente crimes como o de assassinato de membros de quadrilhas rivais.
Um dos crimes mais famosos do período foi o Massacre do Dia de São Valentino, praticado em 1929. Nele, membros do grupo de Al Capone vestidos com uniformes da polícia assassinaram sete pessoas de um grupo rival.
A maior parte das pesquisas relacionadas à Lei Seca destacam que houve uma redução no consumo de bebidas alcoólicas nos anos iniciais da lei, mas com o crescimento do mercado paralelo os índices de consumo voltaram aos níveis anteriores à lei.
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A Crise de 1929 levou a economia dos Estados Unidos a uma grande recessão. Diversos congressistas passaram a defender a revogação da 18ª Emenda para estimular a economia, uma vez que com sua revogação fábricas seriam construídas, assim como uma nova rede de transportes, de bares e diversos outros serviços.
Em 1919, um ano antes de a Lei Seca ser aprovada, cerca de 14% dos impostos arrecadados nos Estados Unidos se relacionavam à produção e consumo de bebidas alcoólicas. Revogar a 18ª Emenda também era uma forma de aumentar a arrecadação. Pensando nisso, Roosevelt assinou em março de 1933 a Lei Cullen-Harrison, que permitiu a produção de cervejas com até 4,0% de álcool, em todo o território dos Estados Unidos.
Em 5 de dezembro a 18ª Emenda foi revogada pelo Congresso dos Estados Unidos. Essa foi a única vez na história que uma emenda foi revogada no país. A revogação colocou fim à Lei Seca.
Fontes
GAZIER, Bernard. A crise de 1929. São Paulo: L&PM, 2009.
KARNAL, Leandro. As histórias dos Estados Unidos. São Paulo: Contexto, 2007.
MCGIRR, Lisa. The War on Alcohol: Prohibition and the Rise of the American State. New York: W. W. Norton & Company, 2015.
Fonte: Brasil Escola - https://brasilescola.uol.com.br/historiag/lei-seca-nos-estados-unidos.htm