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Fim do Apartheid

O fim do Apartheid, regime de segregação racial, se deu em 1994. O término ocorreu por causa de protestos, sobretudo liderados por Mandela, e pressão internacional.

Banco em que está escrito, em inglês, “Apenas para brancos”, na Cidade do Cabo, África do Sul.
Banco em que está escrito, em inglês, “Apenas para brancos”, na Cidade do Cabo, África do Sul.
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O fim do Apartheid foi o término de um regime político que separou negros e brancos na África do Sul durante quatro décadas: de 1948 a 1994. Esse sistema foi chamado de segregacionista e instaurado pelo Partido Nacional, de extrema-direita.

Ao longo do tempo, leis foram sendo aprovadas, retirando cada vez mais direitos dos negros e garantindo privilégios aos brancos. Os negros perderam, inclusive, a permissão para votar, o que fez com que esse partido continuasse no poder por tanto tempo. Internacionalmente, o regime era muito malvisto.

Vários países e a ONU sancionaram o governo sul-africano, como forma de pressioná-lo em favor do fim das divisões raciais. A população também sempre se manifestou contrária, mas era reprimida violentamente pela polícia, que efetivava verdadeiros massacres. Uma das maiores lideranças de oposição foi Nelson Mandela, que ficou preso por 27 anos.

O processo de extinção do Apartheid foi longo e só começou, efetivamente, em 1989, com pequenas reformas no governo de Frederik de Klerk, em diálogo com negros e negras. A presidência seguinte foi de Mandela (o primeiro presidente negro eleito na primeira eleição multirracial do país), que oficializou o encerramento definitivo do Apartheid, com mudanças constitucionais e tantas outras. Contudo, não foi isento de críticas.

Saiba mais: Segregação racial — exclusão sociopolítica baseada em fatores étnicos

Tópicos deste artigo

O que foi o Apartheid?

O nome Apartheid vem do africâner (língua que tem influência de diversas outras, como inglesa e holandesa) e significa, literalmente, “separação”. Esse foi um regime político que segregou negros e brancos, na África do Sul, durante mais de 40 anos (de 1948 a 1994), por isso chamado de segregacionista.

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O Apartheid foi proposto e amparado, por todo esse tempo, pelo Partido Nacional, de extrema-direita, cujo representante inicial foi o pastor Daniel Malan, eleito primeiro-ministro em 1948. Os demais representantes continuaram seguindo sua ideologia, aprofundando leis que concediam privilégios aos brancos e retiravam direitos da população negra. Entre esses direitos, o principal era o voto. Isso garantiu a perpetuação desse mesmo partido (e regime) no poder por décadas.

As divisões raciais na África do Sul existiam desde o Neocolonialismo, no século XIX, quando principalmente ingleses e holandeses invadiram o país. Nesse período, todo o continente africano foi dividido em colônias entre os europeus, e muitas dessas só se tornaram independentes na metade do século XX. O processo colonial é fundamental para entendimento do Apartheid, pois os colonizadores brancos da Europa detiveram o domínio econômico e político desde então.

Entre outros direitos, além do voto, a população negra não podia, por exemplo, adquirir terras. Pessoas negras também não podiam se casar com pessoas de outras etnias. Houve, ainda, uma segregação geográfica, como mostra a imagem acima: bancos em praças, casas, calçadas e vários outros espaços públicos separados. Aos bairros para negros foi dado o nome de bantustões.

  • Videoaula sobre o Apartheid

Causas do fim do Apartheid

As causas do fim do Apartheid foram as pressões internacionais de diversos países e da ONU e manifestações na própria África do Sul, ao longo das décadas do regime.

Desde pelo menos a década de 1950 (ou seja, poucos anos depois de Daniel Malan eleito), os negros e negras já se manifestavam contra a separação racial. Nesse sentido, o Congresso Nacional Africano (CNA) — organização anti-segregação existente desde 1912 — é um modelo dessa resistência, já que quando o Apartheid foi institucionalizado, passou a lançar ideias e ações de desobediência civil contra o regime.

Em uma dessas manifestações, a polícia sul-africana assassinou quase 70 pessoas negras, em 1960. Esse episódio ficou conhecido como Massacre de Sharpeville (nome da cidade onde ocorreu) e gerou uma onda de protestos e indignação em países mundo afora, ao ponto da Organização das Nações Unidas (ONU) fazer declaração pública contrária ao regime. Muitos desses atos aconteceram nos Estados Unidos, que, naquela década, viviam a eclosão de movimentos pelos direitos civis de negros e negras.

Apesar da pressão internacional ao longo dos anos, o Apartheid só teve fim na década de 1990. Para que isso acontecesse, a pressão interna foi fundamental, como veremos no tópico seguinte.

Quadro “Assassinato em Sharpeville”
Quadro “Assassinato em Sharpeville” [1]

Acima, podemos ver a pintura Assassinato em Sharpeville, do pintor e fotógrafo Godfrey Rubens, fazendo alusão ao Massacre de Sharpeville, ocorrido em 21 de março de 1960. Atualmente, o quadro está localizado no consulado da África do Sul de Londres.

Veja também: Panteras Negras — partido que lutou pelos direitos das pessoas negras nos EUA

Como ocorreu o fim do Apartheid?

O fim do Apartheid foi um processo longo, mas pôde ser notado com maior veemência a partir de 1989, no governo de Frederik Klerk, que ouviu as manifestações internacionais e o que a população negra sul-africana clamava havia décadas.

Entre vários manifestantes na África do Sul destacou-se Nelson Mandela, que era membro do CNA e do Lança da Nação, organizações contra o Apartheid que realizavam, além da desobediência civil, ações de sabotagem e luta armada. Por conta disso, o líder foi preso, em 1962, e condenado à prisão perpétua. Sua detenção também causou reações internas e internacionais. 

Cartazes históricos pela liberdade de Mandela na Cidade do Cabo, África do Sul.
Cartazes históricos pela liberdade de Mandela na Cidade do Cabo, África do Sul.[2]

Em 1964, o país chegou a ser banido das Olimpíadas e assim permaneceu por 32 anos.  Enquanto isso, a ONU continuava suas pressões, bem como a população.

Em 1980, mais de 20 países declararam embargo econômico à África do Sul por causa do Apartheid. Nesse período, algumas mudanças começaram, timidamente, a acontecer, como a independência dos territórios dos bantustões. Porém, mesmo assim, Pither Botha, primeiro-ministro de 1984 a 1989, conservou as principais características do regime racista.

O princípio do fim do Apartheid, de fato, só foi percebido a partir de 1989, na presidência de Frederik de Klerk (1989-1994), que promoveu diversas transformações. Entre elas, em 1990, libertou Nelson Mandela da prisão, após 27 anos; legalizou o CNA, que se transformou em um partido; e revogou várias leis raciais. Desse modo, o diálogo entre governo e organizações antirracistas foi iniciado.

Outra medida tomada por Klerk, ouvindo os negros e negras, foi a convocação de um plebiscito, em 1992. Nele, apenas a população branca podia votar, e a pergunta era se queriam ou não o Apartheid. O resultado foi: 68% almejavam o seu fim.

Por conta das ações pelo fim do regime segregacionista, Nelson Mandela e Frederik de Klerk receberam, juntos, o Prêmio Nobel da Paz, em 1993.

Em 1994, a África do Sul realizou a primeira eleição multirracial — ou seja, tanto negros quanto brancos votaram —, e o vencedor foi Mandela, ou Madiba, nome de seu clã, pelo qual ficou conhecido. Desse modo, oficializado em sua posse, finalmente encerravam-se décadas de um regime racista. Em outras palavras: chegava ao fim o Apartheid.

Saiba também: Rosa Parks — símbolo da desobediência civil no contexto racial estadunidense

Mudanças após o fim do Apartheid

Durante a presidência de Nelson Mandela (1994-1999), a África do Sul passou por um processo de democratização que começou com reformas:

  • Uma das primeiras medidas estipuladas, em 1994, primeiro ano de seu governo, foi a restituição das terras tomadas da população negra não só durante o Apartheid, mas desde 1913, com a Lei Natives Land Act, que determinava que nativos negros não podiam comprar terras dos brancos e vice-versa.
  • As mudanças foram acontecendo paulatinamente, por meio de reformas sociais. Destacam-se algumas, como na saúde, em que foi instituída a gratuidade dos cuidados básicos a crianças e mulheres gestantes e lactantes, inclusive as das zonas rurais, anteriormente mais excluídas ainda, não só pelo racismo do Apartheid, mas também geograficamente.
  • Na educação, foram acrescentados investimentos que chegaram, em 1996, ao índice de 25% do orçamento público destinado somente a essa área.
  • Os gastos sociais, de maneira geral, tiveram incrementos. É o caso da previdência e dos subsídios governamentais (por invalidez, velhice, pensões etc.), que, não só aumentaram como passaram a ser distribuídos de maneira igualitária (antes, eram divididos por raça/etnia).

Em maio de 1997, foi promulgada uma nova Constituição, que revogou todas as leis racistas do Apartheid.

No entanto, não só de benesses viveu o governo Madiba.

Presidência de Nelson Mandela

Nelson Mandela assumiu a presidência da África do Sul em 1994. Foi eleito, no primeiro pleito em que negros e negras puderam votar, com mais de 60% dos votos. Cerca de 12 milhões de sul-africanos o elegeram, após ter sido militante radical, na década de 1960, passado duas décadas na cadeia e depois participado, enquanto presidente do CNA, das negociações pelo fim do regime segregacionista.

Sua gestão foi responsável por profundas mudanças, como vimos. Além disso, no campo simbólico, aconteceram transformações, como a modificação da bandeira (que mesclou a dos brancos com a do CNA) e do hino nacional (uma mescla do hino do CNA com o africâner).

Mandela foi o primeiro presidente negro do país e, apesar de ter vencido a eleição, manteve na vice-presidência o ex-presidente branco (o último deles) Klerk e, em outros cargos, alguns demais integrantes do Partido Nacional (idealizador e sustentador do Apartheid durante suas quatro décadas no poder). Isso porque, na verdade, esse foi um governo de coalizão (aliança política interpartidária com objetivo comum), haja vista que o encerramento da segregação e a transição entre gestões branca/negra ou PN/CNA ocorreu de maneira pacificada, negociada, lenta, gradual e reformista.

Essa não é a única controvérsia da presidência de Mandela, que teve membros de sua gestão acusados de corrupção, sendo que ele mesmo foi apontado como responsável pela baixa distribuição de renda. Além disso, no decorrer de seu mandato, escândalos de sua vida pessoal, com a ex-esposa Winnie, vieram à tona, contribuindo para seu desgaste.

A Comissão da Verdade e Reconciliação, estipulada em 1995, apenas apurou o ocorrido durante o longo período do Apartheid, mas não puniu nenhum branco responsável pelos fatos apurados.

O governo Mandela foi bastante criticado também pela intervenção militar no Lesoto, país que se tornou independente da Inglaterra em 1996 e divide fronteiras muito próximas com a África do Sul (chamadas por alguns de “entranhadas”). Temendo que os protestos vizinhos afetassem a estabilidade da gestão, em 1998, ordenou a ocupação da capital, que a destruiu parcialmente.

Ao encerrar o mandato, em maio de 1999, conseguiu eleger um sucessor do seu partido, que, a partir de então, predomina nas eleições sul-africanas ano após ano.

Opositores dizem que Madiba, durante todo o seu mandato, esteve mais preocupado com a reconciliação do que com a reparação. De todo modo, foi — e é — símbolo da resistência negra ao regime político segregacionista do Apartheid e contra o racismo de maneira geral, não só em seu país, mas em todo o mundo.

Nelson Mandela manteve-se na política até 2004, quando anunciou afastamento da vida pública, o que não aconteceu, pois, em 2009, ainda fez uma última aparição e ajudou na eleição de seu correligionário do CNA à presidência do país, confirmando a hegemonia da organização.

Estátua de bronze de 9m de altura do ex-presidente Mandela, em Pretória, África do Sul.
Estátua de bronze de 9m de altura do ex-presidente Mandela, em Pretória, África do Sul. [3]

O ex-presidente sul-africano faleceu por causa de uma infecção pulmonar, aos 95 anos, em 2013, deixando um enorme legado e diversas homenagens, desde a década de 1960, quando foi preso, até aos dias atuais, das mais variadas formas: estátuas, livros, filmes, séries, músicas, HQs, shows etc.

Créditos da imagem

[1] Wikimedia Commons (reprodução)

[2] Adwo / Shutterstock

[3] erichon / Shutterstock

 

Por Mariana de Oliveira Lopes Barbosa
Professora de História

Escritor do artigo
Escrito por: Mariana de Oliveira Lopes Barbosa Doutora em História Social pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU) Graduada e Mestra em História pela Universidade Federal de Goiás (UFG)

Gostaria de fazer a referência deste texto em um trabalho escolar ou acadêmico? Veja:

BARBOSA, Mariana de Oliveira Lopes. "Fim do Apartheid"; Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiag/apartheid.htm. Acesso em 28 de março de 2024.

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